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quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Eu quis ser um ditirambo.


" Eis que nas manhãs tudo fica mais claro. Aquela tal paixão pelo por vir toma sua devida proporção. Percebo nas cores seus tom verdadeiros, reação que se mostra assim, cedinho. Os odores, as formas tem uma particularidade também, querem criar vida, ter razão por se só. Desejam ser amados na sua mais natural forma. 

Ao nascer do sol  tudo vem carregado de "amor fati" na delicadeza pura que as coisas se mostram. A cada olho que se abre, veem a impressão do novo, do "sem saber", e naquele instante único (desprovido da razão, da moral e de qualquer outra coisa alheia ao homem) o brotar da essência sai no suspiro, embalado pelo canto de um galo velho.

Ah! Quem me dera poder captar todas as vezes essa tal essência, e vive-la durante um dia inteiro. Seria um se encontrar consigo, largando de tudo que não está no espírito e me agarrar com aquilo que "é" . 

Pela manhã o sol restaura os adormecidos, iluminando com sua luz mais particular, só para mostrar quem as pessoas verdadeiramente são. Nessa penumbra são poucos que conseguem ver, mas os poucos que percebem dão um valor  preciso para que exista." 

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Tudo aquilo a que se chama amor,


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"Cupidez, amor: ah! como estas duas palavras soam de modo diferente em nossos corações!... Pode ser, portanto, que ambas exprimam o mesmo instinto batizado duas vezes: a primeira do ponto de vista dos que já a possuem, dos que tem um instinto de posse levemente satisfeito e que receiam entretanto pelos seus "bens"; a segunda elogiosamente do ponto de vista dos insatisfeitos e dos ávidos que acham "bom" este instinto  O nosso "amor pelo próximo" não será o desejo imperioso de uma nova propriedade? E não sucede o mesmo com o nosso amor pela ciência, pela verdade? E, mas geralmente, com todos os desejos de novidade?
Cansamo-nos pouco a pouco do antigo, do que possuímos com certeza, temos ainda necessidade de estender as mãos. Mesmo a mais bela paisagem, quando vivemos diante dela mais de três meses, deixa de nos agradar, qualquer margem distante nos atrai mais: geralmente uma posse reduz-se com o uso.
O prazer que tiramos a nós próprios procura manter-se, transformando sempre algo novo em nós mesmos - é precisamente isto que denominamos possuir. Cansar de uma posse é cansar-se de si próprio. (Pode-se também sofrer com o excesso; pode-se, assim, dar o lisonjeiro nome de "amor" a necessidade de jogar fora, de dar.) Ao vermos uma pessoa sofrer, aproveitamos de bom grado essa ocasião para nos apoderarmos dela; é o que faz o homem caridoso, o indivíduo complacente. Também damos o nome de "amor" a este desejo de uma nova posse que desperta em nossa alma e sentimos prazer nisso como sentimos diante do apelo de uma nova conquista.
Mas é o amor de sexo para sexo que se revela mais nitidamente como um desejo de posse: aquele que ama quer ser possuidor exclusivo da pessoa que deseja, quer ter um poder absoluto tanto sobre sua alma como sobre o seu corpo, quer ser amado unicamente, instalar-se e reinar na outra alma como o mais alto e o mais desejável. Se considerarmos que isso ão significa nada menos do que excluir o mundo inteiro do gozo de um bem e de uma felicidade preciosa; se pensarmos que aquele que ama visa empobrecer e privar todos os mais competidores, e tornar-se o dragão do seu tesouro como o mais indiscreto "conquistador", o explorador mais egoísta; se imaginarmos enfim que todo o resto do mundo lhe parece indiferente, desbotado, sem valor, e que está pronto a efetuar qualquer sacrifício, a perturbar qualquer ordem estabelecida, a relegar para segundo plano tudo quanto lhe interessa, espantamo-nos que esta cupidez bárbara, esta furiosa injustiça do amor sexual tenha sido a tal ponto glorificada, deificada em todos os períodos da história, e, pior, que tenha extraído deste amor a ideia de amor concebida como sendo contrária ao egoísmo, quando representa talvez a sua expressão mais espontânea. O hábito, aqui, deve ter sido criado por aqueles que não possuíam e desejavam possui-lo; talvez tenham provavelmente havido sempre demais.(...) Existe realmente, aqui e além da terra, uma espécie de prolongamento do amor, no qual o desejo que dois seres experimentam um pelo outro dá lugar a um novo desejo, a uma nova cobiça, a uma sede superior comum, a de um ideal que ultrapassa a ambos: mas quem é que conhece esse amor? Quem o viveu? O seu verdadeiro nome é amizade. "

A Gaia Ciência, Nietzsche.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

à Dom Castro,



"Ela lembrava com clareza de uma conversa que tiveram no velho alpendre, no final da tarde. Era um dia qualquer, mas nem por isso irrelevante. Rapaz e Moça, ate então um tanto alheios um ao outro, falavam de particularidades remotas, vivencias passadas e alguns sonhos futuros. Sei que começaram a se encontrar nos desabafos e confissões, e no fim já sabiam que um pertencia ao outro.   
Essa memória tem a significância de um tom, do cheiro da Primavera ou dos pios distantes de um cuco."   





Out, 15.

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Dignidade perdida,

Henry Cartier-Bresson,  La Villette, Paris 1929.



"A meditação perdeu toda a sua dignidade exterior; ridicularizou-se o cerimonial e a atitude solene daquele que reflete; já não se poderia continuar a suportar um sages da velha escola. Pensamos demasiado depressa, e pelo caminho, em plena marcha, no meio de negócios de toda a espécie, mesmo quando se trate das coisas mais graves; temos apenas necessidade de pouca preparação, e até de pouco silêncio: tudo se passa como se tivéssemos na cabeça uma máquina que girasse incessantemente e que prosseguisse o seu trabalho, mesmo nas piores circunstâncias. Outrora, quando alguém se queria pôr a pensar - era uma coisa excepcional! - era coisa que se notava imediatamente ; notava-se que queria tornar-se mais sábio e que se preparava para uma ideia: o seu rosto ganhava uma expressão como em oração; o homem detinha-se na sua marcha; ficava até imóvel durante horas na rua, apoiado numa perna ou nas duas, quando a ideia lhe «surgia». A coisa «valia» então «esse trabalho». "

Friedrich Nietzsche, in 'A Gaia Ciência'